Este mês - Dezembro - celebramos os Direitos Humanos e hoje trazemos até vocês uma entrevista que nos permite reflectir sobre Migração com especial foco nos direitos de pessoas em situação irregular. A Teresa Valente é uma jovem que já teve várias experiências internacionais que lhe permitiram viver em diferentes países. Em França fez um CES nesta área e atualmente trabalha como integradora social de pessoas migrantes em situação irregular.
Como começou a tua jornada na área da migração?
Quando tinha 17 fui para Inglaterra estudar, e a partir de aí comecei a ter mais noção de migração e ser imigrante, neste caso em situação regular. Isto foi o início da minha experiência, em migração, o estar longe da família, adaptar-se a uma nova cultura, novo idioma, entre muitos outros desafios. Depois já vivi em França e agora vivo em Espanha. A minha experiência pessoal foi o primeiro contacto mas só me mostrou um pouco, de um tema que engloba variados aspectos.
Em 2021, começou a minha jornada na area da migração, a nível profissional, mudei-me para França e estive um ano na Cruz Vermelha Francesa. Aqui foi o meu primeiro contacto com outro aspecto de migração, migração irregular. E depois mudei-me para Espanha, onde sou integradora social de pessoas migrantes em situação irregular.
No artigo "Integração (ou a falta dela)” no Gerador referes a tua dificuldade de ser migrante em situação regular. De que forma as tuas experiências internacionais moldaram os teus valores e a tua sobre pessoas migrantes?
Sem dúvida, todas as minhas experiências e pessoas que conheci moldaram a pessoa que sou. Desde que me mudei para Inglaterra houve uma mudança. Eu cresci numa cidade, que na altura, era pouco diversa e com baixos níveis de imigração. Sempre tive uma grande admiração por emigrantes, mas quando passas por situações, isso é uma coisa completamente diferente. Situações de discriminação em autocarros, ou ter dificuldade em aceder ao médico porque me negaram um tradutor num sistema de saúde que não está preparada para receber imigrantes. Ser imigrante, também é um trunfo pois ajuda-me a relacionar com as pessoas com quem trabalho, pois partilhamos este rótulo de imigrante e perceber melhor as suas dificuldades, apesar de estarmos em situações distintas da migração.
Nas nossas sociedades há muitos estereótipos negativos relativamente aos migrantes. De que forma podemos combater estas opiniões?
Para mim, o mais importante é estarmos bem informados. Ouvimos e lemos tanta informação nos meios de comunicação social e nas redes sociais que não é verdade. Lemos ou ouvimos e não nos damos ao trabalho de verificar a veracidade. Por isso, recomendo verificar a informação em páginas fidedignas. E, quando ouvimos um amigo ou familiar dizer estereótipos negativos relativamente a imigrantes, não ignorar e rebater.
Que papel uma pessoa deve ter para promover a integração? Como podemos ser ativistas nesta área mesmo que apenas “ativista de sofá”?
Vou repetir o que já disse na questão anterior, e acredito que o mais importante é estar informado e partilhar essa informação nas redes sociais pode ser uma maneira de “ativismo de sofá”. Porém, podemos fazer muito mais. As pessoas cidadãs da sociedade de “acolhimento”, tem um papel fundamental na integração de imigrantes. Quantas vezes não ouvimos “Eles não querem se integrar?” ou “São eles que se têm de adaptar”. Mas, muitas vezes, as pessoas da sociedade de “acolhimento”, não criam espaços para que as pessoas migrantes se integrem e até os excluem, não querendo relacionar-se. Criar espaços de diálogo e oportunidade para imigrantes é essencial.
O que responder a alguém que é contra a migração irregular?
Primeiro, mostrar-lhe os factos que a migração sempre existiu e que a migração não é um ataque à nossa sociedade. Mostrar-lhe os benefícios da migração pode ajudar, pois somos seres egoístas pensando sempre no melhor para nós. E desconstruir os estereótipos negativos que tenha. Segundo, questionar a pessoa se fosse ela? Como se sentiria?
No teu trabalho nesta área tens alguma história que te tenha marcado e que gostasses de partilhar?
Várias histórias marcaram-me ao longo dos últimos anos. De violência policial, barcos afundados, perdas humanas e muito mais. Mas visto que estamos a falar de integração, queria partilhar a história de um amigo meu que um dia veio passar uma tarde com os jovens com quem trabalho. E foi uma atividade simples, ele era italiano, então preparou pizzas italianas com os jovens. E os jovens ensinaram-lhe a fazer pizzas Bereber, típicas da sua cultura. No final, o meu amigo disse-me “Creio que quem é contra migração irregular, viesse partilhar momentos com os jovens, mudava de opinião”. Partilho esta história, pois como já mencionei anteriormente para existir integração tem de existir abertura e disponibilidade de ambos, e não só de imigrantes.
Uma recomendação de um livro.
Vou recomendar dois, um que já li, e outro que está na minha lista para ler. “The Kite runner” de Khaled Hosseini, um dos meus preferidos. “How migration works”, de Hein de Haas. Ainda não li o livro, saiu à pouco tempo mas está na minha lista. Este livro desconstrói estereótipos e mitos falsos que a sociedade tem sobre a migração, o que nos pode ajudar no nosso ativismo.